As mulheres são maioria no Brasil. Segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas representam 51,8% da população brasileira, enquanto os homens são 48,2%. Entretanto, ainda há espaços nos quais a presença feminina é pouco representativa, como, por exemplo, nos transportes de carga. Segundo a Secretaria Nacional de Trânsito, o país tem cerca de 4,39 milhões de Carteiras Nacionais de Habilitação para veículos pesados, dos quais 97,19% é de motoristas homens. Apenas 2,81% são mulheres. Ainda assim, esse cenário vem apresentando algumas mudanças. Um levantamento do Instituto Paulista do Transporte de Carga apontou que, no ano passado, o público feminino aumentou em 61% nas ocupações do setor de transporte rodoviário de carga do Estado de São Paulo. Foram 32.094 admissões. A maior oferta de vagas está nas áreas administrativa e comercial. Mas há quem atue na expansão da mão de obra feminina em outros setores. O intenso leva e traz de cargas por rodovias Brasil à fora requer mais profissionais. Essa realidade é o que move algumas empresas transportadoras a adotar medidas que impulsionam e incentivam a contratação de mulheres no volante. Mas o setor vem encontrando dificuldades para preencher essas vagas.
Ana Jarrouge, presidente executiva do sindicato das empresas de transporte de carga de São Paulo e Região (Cetcesp), acredita que a escassês de mulheres para o exercício da função é uma questão cultural. “Que é uma questão puramente cultural. Eu acho que tem muito disso ainda. As mulheres estão começando a perceber que esse é um setor em que elas podem entrar no mercado de trabalho. Acho que o primeiro de tudo é uma questão cultural mesmo. E outra, a gente tem alguns desafios ligados, principalmente quando se fala em motorista, que hoje é o maior gape quando se fala em falta de mão de obra no segmento de transportes, é a questão da infraestrutura”, diz.
Não só no Brasil como em outros lugares ao redor do mundo tem faltado mão de obra para o transporte de cargas, o que tem se tornado uma oportunidade para muitas mulheres entrarem no ramo. A Márcia, por exemplo, é caminhoneira há cinco anos e tem incentivado cada vez mais mulheres a pegarem a estrada. Durante boa parte da vida dela, Márcia foi motorista de ônibus, porque conseguia conciliar com a maternidade, mas depois que os filhos cresceram, ela decidiu seguir o sonho de virar caminhoneira. “Desde criança, sempre gostei de carro grande, ônibus caminhão. Meu pai era mecânico de caminhão e de ônibus, então toda vez que eu tinha oportunidade de estar perto, eu acompanhava. Minha família apoiou bastante, graças a Deus. Eu vi que era a hora de fazer isso, sair do ônibus e ir para o caminhão, realizar o meu sonho. Aí, logo de cara, já comprei o caminhão”, conta Márcia.
Os problemas que Ana Rarrouge, da Cetcesp, citou são sentidos na pele por Márcia. Ela afirma que grande parte dos banheiros são ruins e que, geralmente, tem que improvisar. “Tem um penico. Na verdade, é uma garrafa pet de dois litros. Corta ela ali, um pouco para o alto, do meio para cima, e fica com ela sempre ali. Deu aquela vontade e não tem lugar… Ou então, os banheiros dos postos são tão ruins que você prefere usar o ‘penico’”, diz. Além disso, Márcia tem que lidar diariamente com o preconceito: “Para mulher na estrada tem essa dificuldade, banheiro, chuveiro, você é confundida as vezes no posto. Porque tem as mulheres que trabalham nos postos de combustíveis. E, quando paro para abastecer e para dormir, porque preciso parar para dormir também, acabo sendo confundida”, diz.
Mesmo assim, Márcia faz questão de manter a vaidade e está sempre com as unhas e os cabelos arrumados. As dificuldades também não impedem que ela continue seguindo o próprio sonho. Ao contrário, por meio das redes sociais, ela tem influenciado outras mulheres e até mesmo homens a seguirem o mesmo sonho que ela. Diariamente, ela compartilha sua rotina com seguidores e diz não ter medo da vida nas estradas.
*Com informações da repórter Camila Yunes